“Pai é quem cria!”

O reconhecimento da paternidade socioafetiva como fonte de esperança aos filhos não biológicos. Com a chegada da Constituição Federal de 1988, muitos direitos ignorados pela sociedade passaram a ter preferencial atenção do Estado, seja pela simples evolução costumeira já existente no corriqueiro dia a dia da população, seja pela verificação da necessidade de se efetivar interesse substancial do indivíduo.

Dentre as significativas e necessárias garantias anunciada pela mais importante Lei do Brasil, surgiu a especial e transformadora proteção aos filhos até então denominados bastardos, quais sejam, os havidos fora do imaculado e formal conceito de família.

O artigo 227, §6° da nossa Constituição trouxe consolo e alívio aos que até então não tinham direitos pelo simples fato de terem nascido à margem do tradicionalismo e do que se considerava revestido pela moral e bons costumes, tornando filhos legítimos e filhos ditos bastardos, apenas “filhos” e garantindo além dos mesmos direitos e qualificações, a proibição de qualquer insurgência de descriminação em razão da origem.

Quase trinta anos após a instituição da Constituição Federal mais recente, a fragilidade legislativa em razão da paternidade socioafetiva ainda é um dos fatores que mais dificulta a aplicação do direito aos casos concretos. A sociedade permanece em conflito entre a verdade biológica e a verdade do sentimento e onde a preferência mais comum era revestida de ações de pais que buscavam negar a relação com seus filhos e de filhos que no anseio íntimo de identificação pessoal e das necessidades de amparo patrimonial buscavam o reconhecimento ainda que imposto pelo judiciário deu-se espaço a novos ares e entendimentos do conceito de família, onde muito mais do que o vínculo biológico natural originário de exames impessoais de laboratório, surgiu a identificação que não se pode explicar, aquela que não se nega, tampouco se comprova por laços de sangue, justamente por terem sido alicerçadas em base impossível de se traduzir em cadeias de ácidos desoxirribonucleicos (DNA), o afeto.

Para a sociedade e principalmente para os diretamente envolvidos nessas relações afetivas, se percebe com clareza que o reconhecimento da paternidade socioafetiva pelos tribunais brasileiros trouxe muito mais do que direcionamento para a solução de litígios antes tidos como impossíveis de se resolver. Aos que foram de toda sorte “criados”, como se filhos fossem, com uma determinada pessoa, todavia no decorrer da vida tiveram direitos e garantias ceifadas pela ausência de formalidade jurídica, ou seja, por não terem em tempo oportuno regularizado sua vontade e condição afetiva, sobreveio a esperança, a certeza da isonomia, do amparo e de que o que fora experiência vivida com plenitude rompeu as barreiras genéticas e se uniu para sempre no sentimento mais essencial do ser humano, prevalecendo o afeto sobre o gene.

Por Dra. Carmen Karine
Advogada da Almeida & Barretto Advogados

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